Sonhar não custa nada (?)

Em cartaz no Sesc Pompéia até o dia 02 de abril, a peça Banco dos Sonhos, direção de Kiko Marques com a Velha Companhia, nos leva novamente, ainda que agora de maneira mais leve, em uma jornada entre passado e presente, real e ficção, concreto e simbólico.

Diferentemente do espetáculo anterior da companhia, o épico de drama e suspense Casa Submersa, de 2019, em que, apesar das alegorias políticas, idas e vindas temporais e sequências oníricas, mantinha sua história em uma estrutura convencional, em Banco dos Sonhos temos uma narrativa não-linear e poética, que não se prende, portanto, a fluxos específicos de tempo e a uma continuidade precisa - e faz parte da diversão completar essas lacunas.

Antes de continuar, a trama. Uma conhecida atriz é recebida por uma visita inesperada: uma funcionária de um banco, que lhe diz que ela está morrendo e em dívida com a instituição que representa, o Banco dos Sonhos. A partir disso, adentramos a cabeça dessa mulher em seus últimos dias, em um mergulho entre passado e presente, "realidade" e "ficção", com o teatro sendo palco (com perdão do duplo sentido) dessa história.

O que se sucede é uma rica experiência em três níveis. Um que busca tratar da própria lógica dos sonhos - com situações que não possuem um final propriamente dito, rostos que se repetem (o que reflete também a própria loucura da qual a protagonista diz sofrer) -, outro que trata de uma relação metalinguística entre vida e arte, o teatro como local de sociabilidade, convívio, ao mesmo tempo que um espaço de criação, em que tudo pode, em que as personagens ganham vida própria. O último nível é a nossa interpretação, enquanto público, desafiado a completar um quebra-cabeças que, ao final, forma uma imagem distinta para cada um que o finaliza. E que isso tudo seja entrecortado por discussões pertinentes como a financeirização da vida, de que tudo deve gerar conteúdo - ou ser conteúdo - e de empresas, atuando sem muita pressão por parte de governos, por vezes exercendo mais poder do que o próprio estado, gera um amálgama estranhamente belo, em que, no meio ao caos cotidiano, se pode, nem que por oitenta minutos, adentrar em um mundo em que tudo pode acontecer, e acontece. 

Por Victor Braz

Comentários

  1. Meu, Deus, preciso assistir Banco dos Sonhos pra ontem!!! 👏🏼👏🏼👏🏼

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