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Mostrando postagens de 2019

Bong Joon-Ho escreve certo por linhas tortas em "Parasita"

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O cinema do sul-coreano Bong Joon-Ho, apesar de passar por diversos gêneros, sempre trabalha com tópicos muito únicos, e que se repetem, ainda que por visões singulares. A presença forte do círculo familiar, e como ela interfere na visão de mundo de seus personagens, é visto com extrema clareza em sua filmografia – desde no filme-de-monstro “O Hospedeiro” até o drama criminal “Mother – Em Busca Pela Verdade” -, além, claro, soma-se também a questão social e política – a crítica as grandes corporações, a preocupação ambiental e experimentos em animais em “Okja”, a luta de classes, contra a ordem social vigente, em “Expresso do Amanhã” -, ou seja, temas recorrentes que, ao ganharem nova roupagem, tendem a sempre nos surpreender outra vez. Nesse sentido, “Parasita”, seu novo longa – exibido dia 1 de novembro no Noitão do Cine Belas Artes, e com estreia no dia 7/11 -, representa a junção de todos esses elementos. O resultado, no entanto, coloca em xeque suas virtudes. ...

Reunião de emergência

T odos entram numa sala e se sentam em uma larga mesa, daquelas típicas de escritório.  - Então, vocês sabem por que chamei todos tão rápido?  Disse a Razão.  Ninguém diz absolutamente nada, afinal, é a Razão falando.  - Pois bem, nos últimos dias ando percebendo um comportamento estranho nas atividades comportamentais e emocionais do Júlio. Ele anda feliz demais, alegre, um pouco distraído, mandando áudio longo...temo que ele esteja...apaixonado.  A expressão de todos muda na sala. A Emoção e seus inúmeros assistentes - Alegria, tristeza, dúvida, raiva… - entram em euforia plena, afinal, nunca tiveram a chance de trabalhar tanto quanto estão para ter agora.  - Por favor, por favor, se acalmem. Sei que é algo inédito para todos e é normal ficarem assim, mas se controlem, estamos trabalhando, ok.  A Razão respira fundo e contínua.  - ...Então, voltando ao que ia dizendo, apesar de ser uma novidade e tanto, e que muito...

Anti-clímax

E se você descobrisse a existência de alguém mais qualificado para viver sua vida?  Pensamento que antes nunca havia experimentado agora paira sobre a mente de Alex  Turner após avistar alguém conhecido, quer dizer, familiar até demais: a si mesmo.  Óbvio, num local lotado como o metrô em horário de pico é extremamente difícil olhar alguém e pensar "eu conheço de algum lugar...", quando acontece muitas vezes só é uma figura semelhante a quem você imaginou, contudo, é raríssimo encarar uma pessoa e dizer "sou eu? Parece comigo..." - nada é impossível, no entanto.  Mas essa sensação de estranheza não é algo que se presume, ela realmente estava presente. Quando avistou-se em meio a multidão, Alex não pensou duas vezes e tentou chegar o mais próximo possível, e, conforme ia avançando, cada vez mais percebia as semelhanças e já estava claro que era ele, não havia mais perguntas.  (Detalhe, seu "outro eu" estava de costas o tempo inteiro, mas el...

Era tudo o que mais queria

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B rasil. 2019.  X vivia de forma solitária.  Ficava em casa, no seu quarto ao invés de interagir com pessoas, frequentar espaços públicos ou respirar arte.  A tecnologia, porém, era sua companheira. Nas redes sociais, conversava com diversas pessoas sob um pseudônimo, uma conta anônima, escondendo sua verdadeira identidade. Com o celular nas mãos, passou a não prestar mais atenção ao mundo à sua volta, nas pessoas, nos locais, em tudo.  Com os fones de ouvido, já não ouvia mais os sons das vozes, dos pássaros cantando, do vento e nem do insuportável barulho produzido pela construção civil.  Usando o corretor automático, já não entendia a própria língua nativa.  Dentro da bolha das mídias sociais e por conta dos algoritmos, já não tinha gostos próprios e consumia somente o que lhe era recomendado.  Aos poucos, passou a não respirar mais ar fresco ou ver a luz do sol e a lua à noite, tampouco notou que, como não falava mais, hav...

Coringa livre

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Querendo ou não, a lógica é a maior inimiga da ficção  "Então o Coringa quer ser solto porque descobriu que o Batman conversava com o Comissário Gordon?" Obviamente uma analogia para a situação envolvendo o vazamento de conversas do ministro Moro(n) - idiota em inglês, hahah - com o procurador Deltan Dallagnol - e claro, a relação delas com o caso do ex-Presidente Lula - o post tenta ser "engraçadão, brother" sem perceber o fato que há por trás: Sim, no mundo normal o Batman e o Gordon seriam presos e o Coringa, possivelmente, solto.  Querido leitor incauto, não é porque leu na web que é verdade, da mesma forma que não é porque saiu da boca de William Bonner que é verídico. Infelizmente, as histórias em quadrinhos são ficção. Apesar de haverem publicações de cunho mais vinculado á realidade, o cerne dessas histórias é a suspensão da realidade. (Uau, falei bonito agora). Voltando ao ponto inicial, nunca seria possível, com o pensamento do mundo e...

Gado Day

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  O s últimos dias não andam sendo fáceis para Jairzinho.  Além de novas notícias envolvendo o filho Zero Um, Flávio - Que, após o Ministério Público ter pedido a quebra de sigilo envolvendo não só dados seus, mas como também de Queiroz (o maior vendedor do Brasil), descobriu-se indícios de lavagem de dinheiro por parte do senador -, a desconexão do guru Olavo de Carvalho do governo e até o mantimento do bloqueio da entrada do Brasil na OCDE - Que havia sido oferecida por Trump durante a barganha na visita (agendada e muito bem combinada, claro) de Bolsonaro nos EUA -, são alguns dos muitos acontecimentos que marcaram a vida do presidente, infelizmente. Pra ele. Todavia, a última semana especialmente foi difícil para o Capitão.  Tudo se inicia após o novo ministro da educação Abraham Weintraub anunciar um corte de trinta por cento no setor. Apesar do mesmo tentar explicar com toda sua eloquência os motivos dessa retenção de valor, em um vídeo fazendo u...

Dica literária

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E stive um bom tempo sem escrever e muitas coisas aconteceram nesse tempo - muitas mesmo. Mas não voltei para falar delas. Uma notícia de ontem já é uma notícia velha. Uma de semana passada então, nem se fala.  Estou aqui para falar de um livro muito importante e muito bonito. Muitos de vocês, talvez, nunca tenham tido o interesse de ler - o Presidente também - e, talvez, também nunca tenham o visto de perto.  Não vou mentir, é uma leitura cansativa, é uma obra longa . Passa das 400 páginas.  Ele foi lançado em 1988 e faz parte de uma série com outros seis. Mas esses nem comentamos, fazem parte de outras épocas que não condizem nem um pouco com a nossa.  Estou falando do belíssimo livro Constituição da República Federativa do Brasil, escrito por uma série de autores da Assembleia Constituinte.  Para os que nunca ouviram falar, a Constituição fala sobre uma sociedade utópica, onde a "democracia, os direitos sociais e individuais, a libe...

Porn brain

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E m seu especial para a Netflix, o hilário "Thinky Pain", Marc Maron, comediante e podcaster, destila sobre vários assuntos, mas, perto do final do show, um incita mais curiosidade.  Ele chama atenção a uma condição que ele chama de "porn brain".  Traduzindo, "pensamento pornográfico".  Uma espécie de fenômeno na mente gerado pelo consumo compulsivo de filmes adultos.  O também ator logo cita um exemplo: "Se você está longe da pornografia tempo suficiente pra sair com alguém e você está prestes à ter relações com essa pessoa e por um segundo pensar 'cadê o outro cara?', você tem "porn brain".  E ele contínua: "Mesmo que logo perceba que se trata de uma situação interativa, que não há 'outro cara', que você é 'o cara', não há o que ser feito".  Basicamente, Maron mostra que a relação passiva de longa data com um produto pode fazê-lo esquecer da relação ativa com as coisas - no cas...