Oppenheimer, de Christopher Nolan - Uma Análise: Final
Então foi com certo temor que revi Oppenheimer, para escrever este texto que você está lendo agora - ou não, então estou escrevendo pra mim, e o problema seria só meu duplamente…vamos voltar para a análise, melhor. E o receio não é porque “na primeira vez é sempre melhor, não é mesmo?” (risada ao fundo), e sim porque a primeira experiência contempla o descobrimento, sentir o que não sentiu antes, e, claro, isso, geralmente, amplifica a sensação de deslumbramento, o maravilhamento diante uma obra a ser desvendada. Dessa forma, quando sentei-me novamente em frente à tela no templo chamado cinema, tive uma experiência menos bombástica (com o perdão do trocadilho), fato, mas muito mais profunda. Tanto no sentido do filme mesmo, de poder me concentrar mais em outros aspectos e prestar atenção em detalhes que não tive a chance na primeira vez, quanto da própria análise, ao poder constatar mais firmemente o que realmente identifico como problemas, por exemplo.
Na primeira parte desta análise propus focar nos aspectos técnicos do filme, para depois mergulhar na história e sua condução, isso quer dizer que posso, e com toda certeza irei, digo de antemão, tratar de spoilers.
O que?
É isso ai, spoiler. Mas serão leves, imagino.
Parte 2 - Um combate moral
Na primeira parte mencionei a estrutura em dois segmentos do filme, sendo um contemplando parte da vida de J.Robert Oppenheimer (encarnado por Cillian Murphy) até sua entrada no Projeto Manhattan e o primeiro teste da bomba atômica, e a outra a campanha de difamação iniciada contra ele por suas oposições à adoção de poderio atômico como armamento de guerra, intercalando com a sabatina do almirante Lewis Strauss (vivido por Robert Downey Jr., e que compõem as cenas em preto-e-branco vistas no trailer). Uma é montada, primeiramente, como uma rápida introdução, apresentando-nos ao personagem-título e seu mundo e contexto, para, segundamente, tratar da preparação em torno da construção da bomba; a outra é um filme-de-tribunal, em que acompanhamos os embates entre as partes.
Tal qual mencionei na Parte 1, fiquei preocupado ao constatar que o clímax do filme, a sequência de maior expectativa, se dá na metade da rodagem, evidenciando de que a bomba e sua criação não seria o foco principal, e sim um ponto de interesse entre vários, entre eles, o que considero como principal, em meu ponto de vista, o debate moral, dentro e fora do filme. No que tange o roteiro, há uma exploração, por exemplo, da mudança de perspectiva de Oppenheimer diante do uso da bomba, primeiramente favorável para depois tornar-se porta voz de discussões políticas sobre o tema e uma voz de oposição dentro dos meios oficiais do governo; fora do filme, sob a mediação de Christopher Nolan, diretor e co-roteirista, lidamos com as informações apresentadas e somos apresentados a um debate em torno da figura do protagonista-título fora da dimensão herói e vilão, ao meu ver simplista, mas muito difundida. Um ingênuo? Alguém deslumbrado com o destaque e a fama que poderiam decorrer da participação em torno de uma grande arma “que poderia acabar com todas as guerras”? São possíveis interpretações que o roteiro abre para discussão, a ser desenvolvida na saída sala.
Ainda nesse ínterim, por outro lado, e foi algo que solidificou-se na segunda sessão, é a questão do maniqueísmo. Sim, o roteiro de Christopher Nolan, Martins Sherwin e Kai Bird desenvolve o personagem-título em suas nuances, trajetória e contradições, mas estamos falando de uma produção Hollywoodiana, portanto, a figura do vilão é necessária. E se na parte 1 argumentei que o personagem de Robert Downey Jr. sofria por ter de representar esse antagonismo, revendo percebi de que esse problema também esbarra no personagem de Dane Dehaan, que, infelizmente, somente faltou ter “sou mau” tatuado na testa, em uma composição que soa em certos momentos como artificial. Outro ponto interessante é o personagem de Alden Ehrenreich, que cumpre dignamente uma função sempre ingrata nos filmes de Nolan: ele é o orelha da história.
Você se lembra de A Origem? A personagem de Elliot Page, Ariadne, era a representação do público na tela, a personagem-orelha, portanto, que não só revelava-nos novas informações sobre os outros personagens, como também fazia as perguntas necessárias para a nossa compreensão da trama. Em Oppenheimer esse papel é mais simples, e o personagem de Ehrenreich somente é aquele que retira as informações de Downey Jr., que vai revelando-o - e a nós, o público - aos poucos suas reais intenções. (O fato de Downey Jr. ser um grande ator redime o fato de seu almirante Strauss ser, infelizmente, unidimensional, e sua performance, denotando o ressentimento crescente e mediocridade do mesmo, ao menos desenvolve de forma satisfatória sua passagem como o vilão da história).
Parte 3 - O papel simbólico das explosões
Algo que considero ser interessante de desenvolver aqui é a simbologia em torno da explosão desenvolvida, ao menos em minha percepção. E ela é apresentada em três situações: a primeira é o teste, a materialização de um trabalho de meses e versão prática do que havia sido teorizado até então pelos personagens; a segunda é logo em seguida, na cena em que Oppenheimer fala em uma espécie de auditório em Los Alamos; a terceira é durante um depoimento, em que o protagonista é confrontando com o fato de que não havia feito considerações morais a respeito das bombas que posteriormente atingiram Hiroshima e Nagasaki. Nas três, o papel da explosão é de demarcar um ponto de virada para o personagem, da realização pessoal para o arrependimento, e deste para a culpa. Esse artifício, se é uma leitura possível, reforça ainda mais o caráter psicológico em torno do personagem, articulando características de sua personalidade com os sentimentos de culpa e seu posterior martírio.
O fim da palestrinha (?)
Não considero que Oppenheimer, de Christopher Nolan, seja um filme que possa passar por um processo de esgotamento, como ocorre com certa frequência. É, portanto, um desses casos de obras que permanecem e que, a cada sessão, tendem a crescer cada vez mais.
Por: Victor Braz.
Ótimo.
ResponderExcluirPreciso muuuito assistir !!!
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